
A igreja mais liberal do século 16 deu seus primeiros passos ainda no século 6, quando santo Agostinho estabeleceu-se na cidade inglesa de Cantuária, com o objetivo de converter os anglo-saxões ao catolicismo. Agostinho tornou-se arcebispo local, colocando a Inglaterra sob a proteção do Vaticano. Foi assim até 1533, quando o rei Henrique VIII pediu o divórcio de sua esposa, Catarina de Aragão para casar-se com Ana Bolena. O papa Clemente VII não só negou o divórcio, como também se recusou a abençoar o segundo casamento. Henrique VIII cortou relações com Roma e se declarou chefe de uma nova igreja, a Anglicana. Os anglicanos têm liberdade para escolher a liturgia que querem seguir. Segundo o anglicanismo, cada um deve decidir seu próprio caminho, por meio de seu livre-arbítrio, sua liberdade moral e intelectual. Cada província adaptou a igreja aos seus próprios valores e idéias criando, democraticamente, uma personalidade distinta até na nomenclatura da igreja em torno do mundo. A liberalidade e a democracia anglicana foram permitindo à igreja se adaptar aos novos tempos, convivendo com a diversidade: em 1994 ordenaram a primeira mulher ao sacerdócio, em 2003 ordenaram o primeiro bispo homossexual. Em 2008, celebraram o primeiro casamento entre dois homens. Mas, por ironia, a igreja que sempre foi diferente das demais igrejas cristãs, está enfraquecendo justamente por seu maior atributo: a liberdade. Depois de 5 séculos, o anglicanismo se divide – quanto mais democracia, mas espaço para divergências. A divisão entre liberais e conservadores está tão acirrada, que surgem opções que vão desde a formação de uma nova igreja até voltar para o catolicismo.
A religião que tenta se modernizar sempre terá um preço a pagar?
Recentemente, o papa Bento XVI condenou as pesquisas com células embrionárias. O mesmo papa reiterou que o inferno é um lugar real, onde as pessoas queimam eternamente. Não é de hoje que o catolicismo se debate contra a ciência: Ela foi contra o átomo, contra a teoria do heliocentrismo (o sol como centro de nossa galáxia), foi contra a datação do mundo, contra o estudo da anatomia em cadáveres, também desaprovou o número zero, assim como o pára-raio... A cada ano, segundo pesquisas, o número de católicos diminui no Brasil.
A religião que não se moderniza sempre terá um preço a pagar?
Em 1823 Joseph Smith, ao rezar nos fundos de sua casa, recebeu a visita do anjo Morôni cuja mensagem foi o início da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias (seus seguidores são os mórmons ou santos). Os mórmons instituíram a poligamia, que foi extinta no grupo em 1890. Além dessa, em 1978, foi extinta a regra que proibia a entrada de negros nos templos. Segundo esta religião, os profetas da doutrina podem mudar mandamentos e leis dentro da igreja a qualquer momento. Mesmo assim as regras citadas, além de polêmicas, criaram dissidências a ponto de Smith e seu irmão serem presos e assassinados a tiros na cadeia, em 1844.
A religião que acompanha a modernidade sempre terá um preço a pagar?
Debate-se muito a necessidade de “modernizar” esta ou aquela religião. Esta “necessidade” abre espaços para divergências que, por sua vez, criam dissidências. No Espiritismo não é diferente. É de assustar quando descobrimos que existem “Espíritas ortodoxos”, “Espíritas Puristas”, “Novos Espíritas”... Muito embora, fique até mesmo difícil entender o tênue fio que separa uma das outras. Afinal, ‘modernidade’ em religião precisa significar ‘dissidência’?
Evidentemente, em Espiritismo, trata-se de um comportamento desnecessário, visto que os escritos de Allan Kardec, que é a Codificação Espírita, são claros até mesmo ao afirmar que o Espiritismo não é uma doutrina hermética. Não há necessidade de patrulhamentos religiosos e doutrinários, mas não podemos olvidar que a causa para escolherem um só homem para o trabalho da Codificação foi a necessidade de unidade doutrinária. Orientado que foi pelo Espírito de Verdade, Kardec está com a primeira palavra. Por isso, é destoante o ufanismo de alguns espíritas que dão conta apenas do aspecto religioso do Espiritismo. Ou o atavismo religioso de expressões como “culto no lar”, tão errônea quanto chamar espírita de ‘kardecista’, mas que muitos ainda contestam - tanto quanto na óbvia e sacramentada diferença entre Espiritismo e Espiritualismo. Precisamos ficar atentos contra a cegueira farisaica, impedindo o avanço progressista do Espiritismo. Existem milhares de espíritas nessa lastimável posição de estacionamento. Crêem, adoram e consolam-se corretamente; todavia, não marcham para diante, no sentido de se tornarem mais sábios e mais nobres.
Talvez seja este o preço a pagar.
2 comentários:
Ótimo texto, George!
Este mundo "muderno" é de dar nó na nossa cabeça mesmo. Encontrar equilíbrio dentro de tanta informação, tanta emoção, tanta contradição é tarefa árdua para todos nós. Democracia gera liberdade, liberdade gera debate e a nossa ignorância transforma tudo isso em dissidência e desavença no lugar de tolerância e descoberta de novos caminhos, unidos pela sabedoria e pelo amor. Tudo muito confuso, mas é bom que continuemos tentando chegar a algum lugar... Grande abraço!
Muito bom!Quanto o preço a pagar é estar atentos, vigilantes com nossos pensamentos e atitudes; cuidar para que não sejamos vítimas da vaidade e do orgulho.
A verdade não é absoluta, portanto gera polêmica, constestações...mas o problema maior acredito é nos preocuparmos demais com a teoria e pouco com a prática.
Abraço! E parabéns pelo texto!
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