Tasso da Silveira foi um escritor e poeta brasileiro, pertencente ao movimento vanguardista ocorrido no início do século 20. Tasso foi um dos representantes da ala espiritualista do modernismo, ao lado de Cecília Meireles. Tasso virou nome de escola pública municipal do Rio de Janeiro, no bairro de Realengo. E ganhou as manchetes do mundo inteiro por conta de uma tragédia. Um homem, que já havia estudado naquele local, entrou armado e disparou contra jovens e crianças, fazendo 11 vítimas fatais e outra dezena de feridos, alguns em estado gravíssimo.
Por trás desta tragédia carioca, mas que atinge a todos brasileiros, existe uma combinação de fatores altamente explosivos. Entre eles, uma aparente incapacidade do homem moderno de compreender o espírito de sociedade, já que sua atenção está direcionada para um imediatismo em adquirir bens, riqueza, poder e lucro.
Ao mesmo tempo, temos o grande número de pessoas que ficam excluídas da vida econômica em todo o mundo, não podendo acompanhar a competitividade dos demais. Estando a evolução do homem subordinada à vida em sociedade , pode-se concluir que os atos de violência surgem do conflito entre pessoas. Esse contato diário com os atos extremados do ser humano torna a todos mais insensíveis, levando-os a desconsiderar suas pequenas atitudes de violência, esquecendo de colocá-los no rol daqueles que devem sofrer o esforço de transformação no trabalho constante de auto-aprimoramento. Porém, não desconsideremos que a palavra violência exprime todo pensamento, complementado ou não por palavras e ações, que exteriorize um sentimento contrário à lei do amor e da caridade.
Diante de um mundo onde o mal parece sair vitorioso a cada esquina, onde as pessoas desonradas parecem (reparem, eu uso “parecem”) se dar muito bem, enquanto as íntegras só se prejudicam, fica fácil dar ouvidos ao nosso “lado negro” e extravasar nossa violência de forma direta ou indireta. Um exemplo muito atual disso é conhecido como bullying, termo inglês utilizado para descrever atos de violência física (direta) ou psicológica (indireta), intencionais e repetidos, praticados por um indivíduo (bully ou valentão) ou grupo de indivíduos (bullies) para intimidar ou agredir um grupo/pessoa incapaz de se defender. Apesar de acontecer com mais frequência em escolas, o bullying pode se manifestar em qualquer contexto onde humanos interajam: trabalho, política, religião, vizinhança e até mesmo em família.
Por mais estapafúrdio que possa parecer, alguns incautos (ou espertinhos) viram neste comportamento agressivo um “novo conceito de sobrevivência”, e apresentaram a absurda teoria das ‘crianças índigo’. Para validar tamanha insensatez, alguns desavisados (ou mais espertinhos) se basearam no item 27, capítulo XVIII, do livro A gênese de Allan Kardec, intitulado “A geração nova”, onde o Codificador fala do período de transição da Terra cujos habitantes irão modificar suas disposições morais. Ou seja, uma geração com o sentimento inato do bem, capaz de resolver conflitos, ao invés de incitá-los. Uma geração movida pela paciência, tolerância e solidariedade. E não pela violência, agressividade ou prepotência. Espíritos que praticam o mal pelo mal, “serão excluídos porque, senão, lhe ocasionariam de novo perturbação e confusão e constituiriam obstáculo ao progresso. Irão expiar o endurecimento de seus corações, uns em mundos inferiores, outros em raças terrestres ainda atrasadas (...). Substitui-los-ão espíritos melhores, que farão reinem em seu seio a justiça, a paz e a fraternidade”.
Para Kardec, estamos assistindo a partida desta geração “perdida” e a chegada da nova, tornando-se fácil distinguirmos uma da outra, pela “natureza das disposições morais, porém, sobretudo das disposições intuitivas e inatas”. Em nenhum momento, portanto, o espiritismo valida o comportamento temperamental explosivo, seja de um índigo ou seja de um bully.
“Entretanto”, diz Kardec no capítulo III, “o mal existe e tem uma causa”. E destaca no item 6: “os males mais numerosos são os que o homem cria pelos seus vícios, os que provêm do seu orgulho, do seu egoísmo, da sua ambição, da sua cupidez, de seus excessos em tudo. Aí a causa das guerras e das calamidades, das dissensões, das injustiças, da opressão do fraco pelo forte, da maior parte, afinal, das enfermidades”. Um dos maiores especialistas mundiais no estudo da civilidade, o italiano Piero Massimo Forni, professor da Universidade Johns Hopkins, afirmou recentemente em seu livro Escolhendo civilidade: 25 regras de conduta atenciosa", que “se melhorarmos a capacidade de nos relacionar, teremos menos brigas, menos estresse e, consequentemente, menos pessoas doentes”.
Em 1801, o médico francês Philippe Pinel, iniciador do tratamento médico da loucura, examinou um homem nobre que jogara sua esposa em um poço, após uma discussão. Pinel constatou que o homem não apresentava nenhuma doença mental. Sigmund Freud, criador da psicanálise, estudou o comportamento irracional do indivíduo. Nos dias de hoje, estudiosos tentam associar a origem de certos comportamentos a causas genéticas e ambientais (o temperamento, herança genética, pouco alterado pelo ambiente, interage com o caráter). O que todos eles descobriram? Que a violência é um comportamento ancestral. Segundo o estudo, a violência vêm sendo utilizada ao longo da história humana, desde os tempos das cavernas, e, sim, constituindo-se às vezes como o melhor jeito de se conseguir alguma coisa, ela ficou “impregnada” em nossos genes. Mas não deixa de ser violência: é sempre o mal em ação, ainda mesmo quando pareça construir um atalho para o bem. Por isso, os mesmos estudiosos acreditam que o melhor para a raça humana seja a prática do altruísmo, tendo como meta a irrestrita felicidade global, pois contestam a validade de uma sociedade voltada tão somente para o consumo material.
Isto não é novidade para os espíritas. Segundo o Espírito Verdade ( item 785 de O livro dos espíritos), o maior obstáculo ao progresso moral é o orgulho e o egoísmo. Ambos caracterizam o sentimento ainda muito imperfeito que aliado à ignorância das leis naturais e seus mecanismos de atuação, originam as ações contrárias a essas mesmas leis constituindo a violência. Como nos diz Meimei, no livro Senda para Deus, ‘Violência não está unicamente nos processos da vida física. Acha-se igualmente ocultada nos recessos de nossa vida íntima. Sabemos que quase todas as ocorrências começam nas fontes do pensamento’. Devemos, por conseguinte, combater a nossa violência interior em todas as suas formas e intensidades. Muitas vezes achamos que não fazemos mal a ninguém, mas nossa impaciência, irritação e nossos pensamentos infelizes agridem ao próximo, assim como agredimos a nós próprios diariamente, através do consumo de fumo, bebidas, remédios e alimentos inadequados ou exagerados, atacando nosso campo emocional e psíquico.
Sempre contemporâneo, apesar de seus mais de 150 anos de vida e de ser constantemente exposto a conceitos absurdos por ‘bullies falsos profetas’, o espiritismo continua sendo um ótimo guia de boa convivência, por seguir sem afetação os ensinamentos Daquele que, um dia, afirmou que os brandos são bem-aventurados, pois possuirão a Terra. Ou seja, a justiça será feita, o fraco e o pacífico já não serão explorados, nem esmagados pelo forte e pelo violento quando, de acordo com a lei do progresso e a promessa de Jesus, a Terra se tornar mundo ditoso, por efeito do afastamento dos maus.
O conhecimento espírita oferece diversas medidas preventivas para evitar que o sofrimento surja em consequência da lei de ação e reação. Se o fato de se possuir algum conhecimento das leis naturais não assegura a ninguém manter um comportamento equilibrado, tal conhecimento, porém, colabora com a educação da não-violência em nossas crianças, por exemplo. Como alerta o pediatra Richard Tremblay, da Universidade de Montreal, na Revista Science: “Não é saber como as crianças aprendem a agredir. É saber como elas aprendem a não agredir”.
E, neste ponto, quando falamos de tragédias como as da escola Tasso de Oliveira, uma das crianças socorridas traz-nos o Tasso poeta, quando, tal como o lírio que floresce em meio ao pântano das escuras emoções humanas, interrompe sua fuga do local do crime para dar um beijo de gratidão no policial que a socorreu e que, hoje, recebe tratamento de herói. Mas a melhor e maior recompensa que o policial recebeu, certamente, foi o beijo agradecido, feito medalha pura que ainda nos faz acreditar no amor que vive em todos nós.
Um comentário:
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