O autor francês, Charles Pinot Duclos (1704-1772), assim escreveu sobre o tema: "A ingratidão consiste em esquecer, desconhecer ou reconhecer mal os benefícios, e se origina da insensibilidade, do orgulho ou do interesse”. Curioso notar as origens que Duclos apresenta para a ingratidão, com destaque para o orgulho, velho conhecido nosso. Velho “adversário da humanidade”, como salientou Lacordaire, no capítulo VII de O Evangelho segundo o espiritismo, item 11. Em seguida, no item 12, é a vez de Adolfo, bispo de Argel, apresentar o orgulho como fonte de todos os nossos males. E um destes males que disseminamos diariamente é, sem dúvida, a ingratidão.
Somos ingratos quando esquecemos as coisas boas que nos fazem. Somos ingratos quando discutimos com nossos pais. Somos ingratos quando “passamos por cima” de nossos colegas de trabalho, na ânsia de defendermos nossos pontos de vista – quando, em verdade, defendemos apenas nosso orgulho. Somos ingratos quando viramos às costas para os problemas do outro. Somos ingratos ao exigimos que nosso próximo, seja ele quem for, seja perfeito, já que somos ingratos, justamente, por sermos moralmente imperfeitos! É o que nos ensina O livro dos espíritos, nas questões 937 e 938. Ali, aprendemos que o egoísmo é o pai da ingratidão. Como podemos observar, então, damos morada a uma família da pesada em nossos corações. Esta família costuma fazer uma verdadeira festa com nossas emoções, levando-nos a cometer erros contra nosso próximo que se convertem em malefícios contra nós mesmos – e disso já não há mais dúvida. Nesta festa, o orgulho é o anfitrião, o egoísmo espalha seu veneno e a ingratidão nos faz dançar a valsa da desilusão. E por que nos desiludimos? Emmanuel é franco e direto: Nos desiludimos porque esperamos muito de nosso próximo. Temos o estranho hábito de esperar sempre algo em troca pelo bem que fizemos ou, simplesmente, pela amizade que dedicamos. Mas, se esperamos algo em troca, que bem que fizemos? Que amizade sincera dedicamos?
Há uma grande dificuldade nossa em nada esperar do bem praticado, pois temos uma necessidade enorme de sermos amados, estimados, queridos, idolatrados - salve, salve! E aí, nosso egoísmo, nosso anfitrião, nos coloca nessa rota dolorida, que nos levará ao encontro de corações endurecidos como os nossos. O melhor, então, é perseverar na prática do bem, evitando participar da festa que aquela família da pesada promove diariamente, sendo os controladores de nossas emoções, e não o contrário, conhecendo-nos a nós mesmos.
Sejamos felizes no que fazemos, pois o que foi esquecido hoje, será lembrado amanhã. E, se assim não for, mais terá o ingrato a pagar do que aquele que sofreu a ingratidão. Por isso, os ingratos são dignos de pena, e não de revolta, pois terão sua solidão para vivenciar suas dores, em resposta às suas ações infelizes, sempre movidas pelo egoísmo.
Seu amigo lhe abandonou à própria sorte? Então ele nem era assim tão seu amigo! Lamentar o que? Seu colega de trabalho faz de tudo para lhe derrubar? Deixe-o em sua gana, que ele se destruirá sozinho. Continue fazendo sua parte e logo encontrará corações mais afeitos ao seu, pois espíritos afins se reconhecem e se (re)encontram, em primícias da felicidade que queremos compartilhar eternamente. E desta felicidade estão excluídos os elementos daquela “família” - o egoísta, o ingrato, o orgulhoso. Relembremos as palavras contidas na questão 938a: “Lastimai os que usam para convosco de um procedimento que não tenhais merecido, pois bem triste se lhes apresentará o reverso da medalha. Não vos aflijais, porém, com isso: será o meio de vos colocardes acima deles”.
Já afirmava meu querido amigo Eduardo, o popular “Tio Dudu”, que, em relação à inveja, o melhor é perceber que não mais convivemos com ela, que passa por nós sem nos incomodar.
Mas não tapemos o sol com a peneira! Não culpemos o próximo por nossas falhas e busquemos sinceramente externar o amor - sentimento que nos eleva, nos modifica e nos faz feliz. Pois na dança da ingratidão um dia somos Julio César, mas, na maioria das vezes, somos Brutus mesmo...
4 comentários:
É amigo, Joanna de Angelis diz "analisa as tuas imperfeições, verifica o que ainda tem a modificar, e conceda ao outro o direito de ser imperfeito também." É difícil pra caramba. Não obstante, tem pessoas que nos aprontam tanto, uma atrás da outra, que nem nos desiludimos mais. Aí lança-se a questão: conceder a eles a chance de continuarem sendo ingratos se assim quiserem, sem que tentemos mudá-los, recriminá-los, agredi-los com nossas palavras ou com o nosso desprezo. Tem gente que costuma dizer: "quem quiser fazer comigo, que faça uma vez só. Comigo nunca mais! E aí refaz Divaldo Franco na palestra sobre Perdão e Autoperdão: quem quiser fazer comigo, faça uma, duas, quantas quiser, ofereça a outra face para ela bater, o problema é dela, não seu. Em outro debate que frequento sobre espiritismo, lançou-se a pergunta outro dia: até onde deve ir o nosso sentimento de autopreservação? Até quando nos afastarmos dos ingratos é autopreservação ou revanchismo, orgulho ferido como vc mesmmo colocou? Eis o maior desafio ao meu ver. Pelo menos para mim. Não me desiludo com nada, mas também não dou chance mais pra aquela pessoa. Mas, continuo tentando, enquanto estivermos por aqui, estou sempre tentando acertar. Beijos e abraços de sempre. Simone
Nossa primo! Ler isso depois de termos estado juntos (a menos de 1 mês atrás) no Panteão onde essa assassinato aconteceu me dá um nervosinho! Imaginar a frieza... enfim... Adoro seus textos! Lendo esse me dei conta que existe uma classe de ingratidão que é a de reconhecer mal os benefícios. Nunca pensei nisso. Outra coisa é num debate ou conversa quando vc perde a noção de estar defendendo seu ponto de vista para começar a defender seu orgulho de não estar errado ou de passar por ignorante nesse ou naquele assunto. Nossa! Vejo tanto isso acontecer!
Beijosssss
O comentário da Simone foi ótimo também!
Auto preservação, até que ponto isso é bom? Minha vó seeeempre dizia, é fácil fazer o bem ao amigo.
Ainda aprendo a usar o "Não obstante..."
Simone mandou bem no comentário dela, hein?!
Sem dúvida algum dia chegamos lá, quando a desilusão será substituída pela compreensão plena sobre a imperfeição alheia (quando superarmos a nossa, naturalmente), mesmo quando sofremos diretamente seus efeitos.
Enquanto isso, é alimentar-se de paciência e tolerância, inclusive conosco quando esquecemos o perdoar 70 vezes 7...
Conta complicada, hein? Enquanto isso, estou tentando sair do 1 vezes 1... Aiai!
Grande Abraço!
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