Quando Ariel, minha primeira filha, nasceu há quinze anos, me vi envolvido com fraldas, chupetas e músicas do cancioneiro popular infantil que já ouvira antes, muito antes dela nascer. Algumas que, até, embalaram os meus sonhos, já que não há como detectar o momento exato em que tais cantigas foram sendo compostas, pois além de terem autoria anônima, são continuamente modificadas, adaptando-se à realidade do grupo de pessoas que as canta. O que se pode afirmar é que as cantigas hoje conhecidas no Brasil têm origem européia, mais especificamente de Portugal e Espanha e que já se adaptaram tanto ao folclore brasileiro que são também o retrato deste país.
Eis que agora, com o nascimento de Louize, minha segunda filha, vejo-me novamente entre fraldas, chupetas e as mesmas canções infantis de sempre, a despeito de novas composições que surgiram neste período, mas que não conseguiram substituir o sonho de se ter uma rua só sua para ladrilhar com pedrinhas de brilhantes. Ou de suplantar o charme da barata que diz ter sete saias de filó, mas, na verdade, só tem uma. Ou, ainda, por não conseguir fazer o sapo lavar o pé...
É curiosa a indignação causada pelo comportamento do batráquio: Ele mora na lagoa e não lava o pé! Mas por quê? Porquê não quer! Simples assim. Se ficamos revoltados com o comportamento do sapo é porque não compreendemos bem duas coisas: Primeiro, o direito de escolha. O sapo está, apenas, exercendo o livre-arbítrio dele, a escolha de não lavar o pé, ou por desconhecer os benefícios da higiene ou por achar desnecessário limpar seus pés, ainda que morando na lagoa. Ele não é obrigado a lavar o pé, ele pode optar em não lavar. A escolha – e as conseqüências desta escolha – dizem respeito apenas ao sapo, ninguém mais.
Devido a um entendimento equivocado da chamada lei de causa e efeito, estamos desenvolvendo um estranho comportamento baseado no “tenho que”. Tenho que amar ao próximo, tenho que perdoar meu inimigo, tenho que gostar de um filme ou de um livro só porque se diz espírita, mesmo que o conteúdo seja duvidoso do ponto de vista doutrinário, e por aí vai... Acontece que não existe isso de “tenho que”. Não temos que aceitar equívocos em nome do espiritismo e não existe lei que obrigue a alguém amar ou perdoar. Mas e os dez mandamentos? Alguns pesquisadores informam que os tradutores da Bíblia se equivocaram (talvez de propósito) e utilizaram a expressão “mandamento” no lugar de “palavra”, aqui utilizada no sentido de orientar. Ou seja, Moisés teria recebido as dez orientações de Deus. Outros estudiosos afirmam também que a tradução do original em hebraico está mais para “exercício” do que “mandar”. Assim, Moisés teria recebido os dez exercícios de Deus para a humanidade desenvolver seu conhecimento, se conscientizar, pois é na consciência que a Lei de Deus está em nós, conforme a questão 621 de O livro dos espíritos. Palavra ou exercício fica mais palatável do que mandamento, já que é difícil imaginar Deus exigindo que alguém ame (ou perdoe) por obrigação. O sentimento verdadeiro é aquele realizado por livre e espontânea vontade. Exercitado continuamente.
E aqui entra a segunda questão para compreendermos a postura do sapo: A justiça da reencarnação. O que não se aprende pelo exercício nesta vida aprende-se em outra. E nem poderia ser diferente, já que estamos em um planeta que abriga seres imperfeitos, a caminho do progresso. Como já dissemos acima, talvez o sapo não lave o pé por desconhecer a importância da higiene. Ou talvez ele não lave por ser desleixado com seu corpo. Mas um dia ele vai aprender. Porém isso diz respeito a ele. Assim como nossas escolhas dizem respeito a nós. Fato é que, através do exercício contínuo, de encarnação em encarnação, vamos construindo nossa perfeição. Sem obrigações, mas com a consciência do sentimento verdadeiro, para então realizar o amor ao próximo que Jesus nos ensinou, respeitando suas escolhas.
Como a do sapo, que escolheu não lavar o pé porque não quer e ponto final!
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